02/04/11

leitura em suspenso

Esta reflexão muito particular impõe-se-me e surgiu à página 133 de uma biografia que estou a ler, biografia essa que se explana ao longo de 726 páginas. Esta imposição explica-se pois desde sempre senti uma necessidade feroz de expiação, ou seja, qualquer acto praticado e que as minhas entranhas automaticamente repudiem, sinto necessidade de confessar e para não fugir à regra cá vai: ultimamente, com raras excepções, livro que tenha começado a ler, não acabo “Breve história de quase tudo”, Homens, espadas e tomates”, “Biografia de Fernando Pessoa”, “Biografia de Nelson Mandela”, “Guerra mundial Z” e mais uns dois ou três.

Eu sei que parece mau, quiçá até patológico, mas após pensar um pouco o meu retorcido cérebro encontra lógica nestes factos, ora sigam-me. Nem há um ano li de uma assentada “A insustentável leveza do ser” e “Cem anos de solidão”, acontece que depois destes livros, muitos dos que se seguiram pareceram “não aquilo” e por consequência uns foram sendo acabados a custo e outros ficaram pelo caminho.

O meu cérebro achou curioso o facto de, agora, não me satisfazer em termos literários o comum, o trivial, o que não tem o mesmo peso nem substância, ou seja, o que não me prende nem me encanta da mesma forma que outros livros fizeram. O meu cérebro ao achar este facto curioso sentiu-se também legitimado a fazer uma analogia com a vida!

Sabem quando estamos insatisfeitos mas não sabemos bem porquê, seja no trabalho, seja com a família, seja com os amigos, seja no amor? Temo que a resposta seja óbvia, só provamos esse sentimento porque já conhecemos, em situações semelhantes, melhor. Em algum momento da nossa vida já pensamos, “é isto, é isto que quero para mim, é assim que gosto de ser tratado, é assim que gosto de me sentir” e tudo o que não corresponda à expectativa criada é menosprezado consciente ou inconscientemente. E isto fez-me pensar sobre o porquê de eu não me dar a relacionamentos duradoiros e à luz desta constatação a resposta pareceu-me óbvia. A verdade é que já senti verdadeira afeição, chamemos-lhe amor e o meu espírito parece não sossegar com nada menos do que isto e nada avança nem se prolonga, tal como as palavras nos livros que não acabo de ler e que permanecem ancoradas, impedidas de percorrer os turvos rios do meu pensamento.

Espero um dia acabar os livros cuja leitura ficou por completar, alguns desses para breve, entretanto continuarei a ler o que interrompi na página 133 para escrever esta reflexão. A plenitude da obra, a extenuante e árdua recolha de documentos fidedignos, o cuidado com que foi escrito, a curiosidade que me desperta a personagem, não só pelo seu carácter mas também pela relevância histórica e legado, entusiasma e folheio-o o mais avidamente que consigo. A vida e obra de Winston Churchill fizeram-me retomar o sequioso gosto pela leitura, já o facto de ter recuperado o gosto pelo amor não foi devido a nenhum inglês badocha de certeza…

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